sexta-feira, 31 de julho de 2009

CARTAS...

LITERATURA EM FOCO
REVISTA LITERÁRIA ON-LINE
Por Letícia Nogueira
Carta 1.
Mãe, eu não queria ser tão direta, mas num vai ter jeito, o papel no Suriname é caro, muito caro. Mãe, o pai morreu. Foi assim: ele foi ao médico (mãe, no Suriname os médicos se vestem com terno preto e gravata vermelha ) reclamou de dor no peito. O médico deu uma risada, disse assim: “gases, gases”. Mandou ele para casa. Papai riu e disse: “imagina!, ir no médico por causa dum peidos de nada”. O resto a senhora já sabe. Manda um dinheiro, senão num dá para enterrar o pai.
Carta 2.
Mãe, como a senhora não mandou dinheiro, eu tive que enterrar o pai no quintal mesmo. A senhora imagina, mãe, que aqui no Suriname tem um imposto para ser enterrado? Eu perguntei o porquê da taxa; o médico — que mandou o papai peidar em casa — é, também, o prefeito da cidade; ele disse assim: “se vocês pagam imposto para cagar lá no Brasil, por que aqui não podem pagar para morrer no Suri Suri?”
Carta 3.
Mãe, ontem eu acordei o pai estava desenterrado, acho que a cova ficou rasa demais. Tinha dois cachorros comendo o cu do pai, mãe, literalmente. O que aconteceu com a senhora? Às vezes penso que a senhora não gostava muito do pai, e que deve estar rindo com a boca bem aberta, só porque eu disse que um pastor alemão comeu o cu dele. Mãe, manda dinheiro. Ah! O prefeito perguntou se a senhora gosta dum coroa charmoso.
Carta 4.
Mãe, o dinheiro não chegou. Eu falei para o médico/prefeito o que aconteceu. Ele disse que se fosse no Brasil o cu do pai já estaria no osso bem antes dele morrer. Mãe eu quero ir embora daqui. Manda o dinheiro.
No Comments to...“Cartas do Suriname - Cap. I”
Sueli Aduan Your comment is awaiting moderation. wrote on July 31st, 2009
Impressionante como apesar do uso de “algumas palavras”, digamos chulas, a autora consegue estabelecer uma beleza, uma poética.Gostei muito. A tristeza da imagem tem como contraponto um humor “sutil” na maneira como descreve os fatos Critico. Reflexivo.
Parabéns

quarta-feira, 15 de julho de 2009

faz falta uma árvore sim, eu sei

da janela do meu quarto avisto
prédios, com suas variadas cores.
casas mais próximas com suas
varandas, cadeiras, vasos, flores,
e às vezes até alguém lendo
O que será que lê esse sujeito
que não conheço e,
que mora duas quadras da minha janela.

Clic. abro outra janela.
Esse sujeito eu conheço.
Conheço? Existe? Talvez.
do outro lado da calçada, o chorão.
enxergo cada folhinha.
venta sinto seu cheiro,
cheiro agridoce.
podia ser minha. Minha?
a vizinha implicou:
a folha, a sujeira, em dia de chuva.
bláblábalá
Falei tudo bem, deixa pra lá.

Plantaram em outro lugar.
Pra me consolar pensei: é só uma árvore.
É isso mesmo.
Por que esse espanto?
Não estamos todos divididos?
os que querem,
os que não.
os que lutam,
os que desistem.
os que calam,
consentem,
mentem.
os que puxam o gatilho.
os...

Chega!
estou perfeitamente adaptada,
mas faz falta uma árvore sim, eu sei.

quinta-feira, 9 de julho de 2009

..."diz que se chama Saudade"

Tantos eles

tantos nomes
flutuam em minha mente.
Vidas
Belas,
Fortes,
só por elas
já vale a pena.
é Poe, é Proust, é Wagner,
Leminski, Caetano, Rodrigo,
Pessoa,
Michael,
Pedro,
Antonio.

esses nomes e tantos outros
Movem o meu ser.
eu sou, eu estou.
só por eles,
tudo tem sentido e dá sentido
é a música,
é o absurdo,
é o avesso.
a alma que não é pequena
a vida que vale a pena
São tantos eles.

domingo, 5 de julho de 2009

Uma atitude genial ??? Tenho minhas dúvidas.

não sei o que é preciso para expor-se assim e, como se sente depois disso tudo, enfim ...

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Revisto BRAVO! Julho/2009 - Por Armando Antenore
Investigação Sobre o Amor
Um debate na Flip, um livro e uma instalação buscam compreender por que o escritor Grégoire Bouillier terminou o namoro com Sophie Calle, a cultuada artista contemporânea francesa

...Era uma mensagem de ruptura. Um fora. Uma despedida. Nos sete parágrafos da correspondência, Grégoire respeitava em parte o script que os amantes costumam seguir quando resolvem se afastar. Proclamava que nunca esqueceria Sophie e enaltecia a relação dos dois.
No entanto, uma afirmação inusitada punha em xeque as mesuras diplomáticas, diferenciando aquele adeus de outros do gênero.

"Cuide-se"
O e-mail em que Grégoire Bouillier rompe com Sophie Calle
"Há algum tempo, venho querendo responder seu último e-mail.”
Na verdade, preferia dizer o que tenho a dizer de viva voz. No entanto, vou fazê-lo por escrito.
Você já pôde notar que não estou bem ultimamente. É como se não me reconhecesse em minha própria existência. Sinto uma espécie de angústia terrível, contra a qual não consigo fazer grande coisa, exceto seguir adiante para tentar superá-la. Quando nos conhecemos, você impôs uma condição: não ser a 'quarta'. Eu mantive o meu compromisso: há meses deixei de ver as 'outras', não achando logicamente um meio de vê-las sem transformar você em uma delas.
Pensei que isso bastasse. Pensei que amar você e que o seu amor — o mais benéfico que jamais tive — seriam suficientes. Pensei que assim aquietaria a angústia que me faz sempre querer buscar novos horizontes e me impede de ser tranquilo ou simplesmente feliz e 'generoso'. Pensei que a escrita seria um remédio, que meu desassossego se dissolveria nela para encontrar você. Mas não. Estou pior ainda; não tenho condições nem sequer de lhe explicar o estado em que mergulhei. Então, nesta semana, comecei a procurar as 'outras'. Sei bem o que isso significa para mim e em que tipo de ciclo estou entrando. Nunca menti para você e não é agora que vou começar.
Houve uma outra regra que você impôs no início de nossa história: no dia em que deixássemos de ser amantes, seria inconcebível para você me ver novamente. Você sabe que essa imposição me parece desastrosa, injusta (já que você ainda vê B., R.,…) e compreensível (obviamente…). Com isso, jamais poderia me tornar seu amigo. Você pode, então, avaliar a importância de minha decisão, uma vez que estou disposto a me curvar diante de sua vontade, ainda que deixar de ver você e de falar com você, de apreender o seu olhar sobre os seres e a doçura com que você me trata sejam coisas das quais sentirei uma saudade infinita. Aconteça o que acontecer, saiba que nunca deixarei de amar você do modo que sempre amei desde que nos conhecemos, e esse amor se estenderá em mim e, tenho certeza, jamais morrerá.
Mas hoje seria a pior das farsas manter uma situação que, você sabe tão bem quanto eu, se tornou irremediável, mesmo com todo o amor que sentimos um pelo outro. E é justamente esse amor que me obriga a ser honesto com você mais uma vez, como última prova do que houve entre nós e que permanecerá único.
Gostaria que as coisas tivessem tomado um rumo diferente.