terça-feira, 31 de agosto de 2010

Ruminar ideias

Acordava antes de todos. Descia as escadas pé ante pé o mínimo barulho seria fatal. Sabia que iriam reclamar implicar mesmo com sua mania de sair cedinho. O que fazer se esse era seu método de trabalho? Caminhar pelas ruelas tranqüilas, encher-se da paisagem, do silêncio, observar o início de mais um dia, das poucas pessoas que cruzavam seu caminho, dos gatos tombando latas de lixo, do cheiro do pão, e muito mais. Depois, muito depois, com a caneta e o papel em branco ou, às vezes, sentado defronte ao teclado, ruminar ideias, elaborar frases, jogar com as palavras, escolher uma a uma como se escolhesse feijão. Escrever suas impressões, seu sentir, seu espanto perante um mundo em eterno movimento. Assim era seu ofício. Ofício de escritor. Às tardes eram, então, dedicadas à leitura, à pesquisa, sabedor que era de que não há inspiração, mas como costumava dizer: — eclosão, de que nada se cria sem técnica e disciplina, sem trabalho e persuasão.Como era lindo esse ritual, quase religioso. Uma verdadeira devoção. Dia após dia lá estava ele, um sujeito comum igual a tantos outros, não um sonhador como muitos pensavam, um lunático, não.Apenas um homem que via na arte da escrita o verdadeiro sentido das coisas e dizia: — uma vida só pra mim não basta eu preciso inventar, criar histórias. E nesse ato criativo sonhar, rir, chorar com os personagens, com toda trama em que me deleito e que meu leitor se reconheça.
Uma catarse literária em que ambos vislumbrem a própria vida


sexta-feira, 27 de agosto de 2010

da série- Tenho um amigo que disse que eu:



Não devia ficar preocupada com tantas coisas, não. Que tudo é muito passageiro, que quando menos se espera, cada coisa toma o seu lugar, que não vale a pena todo o desgaste e blábláblá. Mas, o que sabe ele das coisas com as quais me preocupo? E como assim, tantas coisas? Ele me conhece pouco, muito pouco, mesmo. Sou é muito sossegada, até por demais, água morna dura de ferver, como dizia meu avô. Mas, uma coisa aprendi, temos sempre que escolher. Não tem jeito, não. Ou isto, ou aquilo, rosas ou margaridas, vermelho ou azul, como dizia o poeta.
Um outro amigo, desses todo prosa, disse que é exatamente isso mesmo, que só quando decidimos é que respiramos aliviados. E que a palavra já diz tudo. Com um risinho todo maroto, completou: - Veja bem, o caso da palavra preocupação, ou seja, ocupar a mente antes pra quê, entendem?
Como se a gente não entendesse o que acaba de escutar, falei toda cheia de mim. E não entende, não, minha caríssima, disse um outro amigo já puxando a cadeira pronto para argumentar. Como assim, perguntei eu toda curiosa? E ele foi logo respondendo todo satisfeito, feito um professor diante do aluno.
É que as palavras têm muitos sentidos, cada um as interpreta à sua maneira, às vezes, disse ele:- o silêncio é o melhor mensageiro. Nessa hora, como num passe de mágica, ficamos todos numa quietude de dar gosto, prontos para ouvir àquele amigo, que com voz mansa foi logo dizendo: - Difíceis as nossas escolhas e, às vezes, nos sentimos de mãos atadas, a nos perguntar por que não conseguimos decidir: falta-nos coragem, sobra o muito ruminar.
E, ali sentados, totalmente despreocupados, embevecidos diante de tanta sabedoria ouvíamos nosso amigo, esse amante das palavras e do silêncio. Sabedor de que é preciso ouvir a língua fora do poder, no esplendor de uma revolução, a qual ele delicadamente chama de literatura.

quarta-feira, 25 de agosto de 2010

AULA - II parte-


 

Este deslocamento se fez porque a sociedade intelectual mudou, quanto mais não fosse pela ruptura de maio de 68. Por outro lado, o próprio poder como categoria discursiva, se dividia, se estendia como uma água que escorre por toda parte.
Uma reflexão torna-se necessária sobre a força de fugir da palavra gregária através do texto lugares, em que, a escritura e a semiologia se conjugam e se corrigem uma à outra. Fugir da palavra gregária não por que a semiologia negue o signo (apofática), mas porque nega que seja possível atribuir lhes caracteres positivos. fixos, a-históricos, a-corpóreos, em suma: científicos .
Segundo o pensador, esse apofatismo acarreta duas conseqüências que interessam, diretamente, ao ensino da semiologia:
a) não pode ser uma metalinguagem; toda relação de exterioridade de uma linguagem com respeito a outra é insustentável. O que sou obrigado a assumir falando dos signos com signos é o próprio espetáculo dessa bizarra coincidência ;
b) ter uma relação com a ciência, mas não é uma disciplina. Mas, que relação? uma relação ancilar: ela pode ajudar certas ciências.
Ao fundamentar-se na Semiologia, Barthes abre, a meu ver, caminhos para libertar a linguagem para o prazer do texto e renova, desse modo, a maneira de manter um discurso sem o impor; pois o que pode ser opressivo em um ensino não é o saber ou a cultura que ele veicula, são as formas discursivas através das quais ele é proposto. Entendendo-se que para uma mesma formação ideológica há diferentes formas enunciativas, pois o enunciado pode ser repetido em situações estritas, a enunciação jamais; o que permite ao enunciador se deslocar de acordo com o seu(s) interlocutor(es), isto é, o discurso pode ser o mesmo, porem, sua forma enunciativa é diferente.
Desse modo, o autor desloca as palavras, desfocaliza significantes de significados, desnivela a enunciação estabelece um jogo marginaliza um assunto e enfatiza outro. É nesse domínio do léxico que ele age. É, ao mesmo tempo, polido, modesto e irônico. A sua prática de escrever se ritualiza não em uma comunicação imediata, o que justifica as várias vírgulas, dois pontos, hífens, paralelismos gramatical, etc. Porém, o discurso em Barthes se constitui, me é crível, na recusa de um modelo pragmático e, assim, trapaceia coma língua, fazendo do texto a Aula uma demonstração de como jogar com os signos lingüísticos. Ao mesmo tempo em que fala da semiosis, a usa como exemplo do que afirma, reafirma, teima, desloca-se e, até joga com a possibilidade de abjurar. E, essa competência, me faz vê-lo como uma espécie de singularidade mística enquanto discurso,é claro.   

 BARTHES,Roland. Aula. Trad. Leyla Perrone Moisés. São Paulo: Cultrix, 1988         
             



domingo, 22 de agosto de 2010

AULA


Na concepção barthesiana falar é, com maior razão, discorrer, não é comunicar; é sujeitar: toda língua é uma reição generalizada . Então, penso eu, pobre mortal, como sobreviver a isso? Barthes indica um caminho: esse logro magnífico que permite ouvir a língua fora do poder, no esplendor de uma revolução, eu chamo, quanto a mim; literatura (Parece-nos, assim, que a liberdade humana só é possível fora da linguagem. No entanto, só existimos dentro dela, uma vez que não há separação entre homem e linguagem. Estudar a linguagem fora do humano é, explicitamente, destituir o sujeito da linguagem e vice-versa. Estaríamos desse modo, condenados à prisão perpétua, nessa rede de poder que constitui os discursos de saber? Essas vontades de verdade que há muito se perfilam e são formuladas, reformuladas e reempregadas no caminhar humano? E aqui entra, creio eu, a idéia barthesiana de trapaça, de logro magnífico com a língua. Não podemos destruí-la, nem viver em seu exterior, contudo, podemos desviá-la de seus sentidos articulados, estereotipados, destituindo, dessa maneira, os mecanismos de poder perpassados nos interstícios sígnicos, ou para ir mais longe ainda, nos vários conjuntos de enunciados.
Barthes nos leva a refletir sobre as forças de liberdade que existem na literatura a prática da escrita. Essas forças são articuladas sobre três conceitos gregos: mathesis, mimesis e semiosis.
A primeira força corresponde à força dos saberes, visto que todas as ciências estão presentes no monumento literário. E nesse sentido, a literatura é o próprio fulgor do real. Ela faz girar os saberes não fixa, não fetichiza nenhum deles; ela lhes dá um lugar indireto, e esse indireto é precioso. Mas Barthes nos mostra os dois lados dessa força: a) a permissividade para designar saberes possíveis insuspeitos, irrealizados; b) o saber que mobiliza nunca é inteiro nem derradeiro.
A segunda força da literatura é sua força de representação. É, justamente, por querer representá-la que há uma história da literatura. Entretanto, o real pode ser apenas uma espécie de demonstração, e é por que há o real (pluridimensional) e a linguagem (unidimensional) que se produz a literatura. Barthes afirma: desde os tempos antigos até as tentativas da vanguarda, a literatura se afaina da representação de uma coisa. O quê? Direi brutalmente: o real . Ora, podemos fugir dessa história da literatura? Se rompermos com o elo entre o real e a linguagem. É possível? Talvez, através de existentes-não-reais somente existentes nas tentativas virtuais, na pluralidade de (im) possíveis olhares.
A terceira força da literatura é a que fora indagada acima; é um método de jogo. Teimar e deslocar-se, isto é, instituir no próprio seio da linguagem servil uma verdadeira heteronímia. Nessa perspectiva, surge a semiologia objetivando estudar a linguagem trabalhada pelo poder. Daí deslocou-se, coloriu-se. Este deslocamento.....
Em outro post!!!!

BARTHES, Roland. Aula. Trad. Leyla Perrone-Moisés. São Paulo: Cultrix, 1988

Roland Barthes, na aula inaugural da cadeira de Semiologia Literária que proferiu no Colégio de França, em 7 de janeiro de 1977, fez esta afirmativa que renova a crença nas pessoas que acreditam no poder da literatura:

"Se, por não sei que excesso de socialismo ou de barbárie, todas as nossas disciplinas devessem ser expulsas do ensino, exceto numa, é a disciplina literária que devia ser salva, pois todas as ciências estão presentes no monumento literário". (Aula: 1978 p. 18)

segunda-feira, 16 de agosto de 2010

FOGO ERA ONTEM

I num é que Dordélia perdeu. Não se conformou. Sentou-se ali mesmo no chão, e muito lentamente foi tirando os sapatos. Primeiro um, depois o outro, devagar alheia a tudo. Como num ritual, desabotoou a fivelinha apertada dos sapatos de Marcelina.
Na memória cada palavra da prima doía mais que ferro quente em gado marcado:
_ocê sabe, né, Delia? Esse sapatinho branco é mágico, feito a rosa mogorim que a gente infeita tudo a casa, i sem sabe como tudo di ruim vai pra longe... trôce é muita sorte esse danadinho. Era pôr nos pé, e tudo virava pro meu lado. Imprestu procê cum gosto.
_Marcelina, ocê credita im cada uma.
_Ocê que é uma descrente. Ocê nunca ficô cumo eu, perto de vô. Cuidei muito tempo dele, e apesar de toda trabaeira foi é muito bão. Aprendi por demais.
Aprendi a crê na vida, a te pacência, sabê esperá a hora certa das coisa. Vô sempre gostô de conta istória. As veis parava de falá, levantava aquele zoião como querendo vê disconfiança i mim, mai nunca incontrô, sabia que eu era atenta as coisa do mundo, i tem muito que nóis num sabe. Achu inté qui nem ele sabia.
Agora, ali sozinha, Dordélia também queria crer, pelo menos um pouco.
De repente pôs-se a chorar, com tanta força que nem sabia que tinha... chorou, chorou, chorou, seus olhos ficaram vermelhos , vermelhos como a terra em volta, vermelhos como o fogo.
O fogo que Guilhermano dizia sentir, que não se apagaria nunca. Eterno.
E pela primeira vez Dordélia benzeu-se.
Por que confiou em Guilhermano? Como não confiar? Seu jeito doce, seus olhos claros, sua fala mansa, as juras de amor sussurrada aos seus ouvidos, os lábios a roçar-lhe o pescoço, os beijos ardentes, tudo tão forte, tão intenso que ela até ruborizava, ardia mesmo, um calor tão bom.
Ele gostava. Ela sabia. Não era mais uma menina.
Quanto mais sua pele ia ficando vermelha mais ele a apertava, mais encostava seu corpo contra o dela, apertando-a contra a cerca.
Cerca que o pai fizera com tanto carinho. Por um momento sentiu-se culpada, como se tivesse traindo o pai.
A imagem da cerca vermelha, a casinha branca ao fundo, o pai gritando com o gado, a mãe ali parada na porta fingindo cuidar das plantas da varanda, aumentavam ainda mais sua tristeza.
E tudo vinha à mente de Dordélia. Ela só queria entender.
_Mãe sabia. Por que, então, acobertava? Não era muié fogosa, era até meio caladona, vivia dizendo:
- Muié tem qui si dá u respeitu, num tem tanta precisão de hóme.
_uai, pru que, intão, ficava ali oiando. Será que era vuntade?
Vontade que Dordélia e Guilhermano tinham de sobra. Era só o olhar de um cruzar o olhar do outro e pronto. Corriam lá pra cerca...
E agora o que ia ser da vida dela? E do filho que esperava? Guilhermano teria fugido, ficou com medo? Não. Não era possível. Ele mesmo falou na noite anterior:
-Delinha, tá tudu acertado cum o padre. Ele vai lá pros lado do ribeirão, sabe donde qui é?
_sei sim, i já gostei da escoia do lugar. É tão lindo, Guilhermano. A gente vê os jequetibá, as perobeira e até caneleira. Que mata que belezura... Pena né, nóis não podê cunvida ninguém, tem portância, não. To é muito feliz, vou tá toda de branco, até os sapato.
Ele não veio. Ela sabia. Não era mais uma menina.
Nada é eterno, Dordélia se enganara.
Fogo era ontem.


terça-feira, 10 de agosto de 2010

“Mundo e corpo - sujeito e objeto”

Quando minha mão direita toca a esquerda, sinto-a como uma coisa física, mas no mesmo instante, se eu quiser, um acontecimento extraordinário se produz: eis que minha mão esquerda também se põe a sentir a mão direita. Nele (meu corpo) e por ele não há somente um relacionamento em sentido único daquele que sente com aquilo que ele sente: ocorre uma reviravolta na relação, a mão tocada torna-se tocante, obrigando-me a dizer que o tato está espalhado por todo o corpo, que o corpo é ‘coisa sensitiva’, sujeito e objeto. A mão direita é sujeito? A esquerda é objeto? Ou ambas sujeito e objeto? Parece que tais questões deixam de ter importância quando nos preocupamos com a experiência sensível ou com a busca do ser bruto. A experiência tátil, o tocar e o ser tocado, bem como a experiência visível, ver e ser visto, emergem de um mesmo tipo de ser. O corpo pertence às duas ordens do sujeito e do objeto ao mesmo tempo. Tal relação pode ser transposta para a relação corpo e mundo. O corpo também pertence à ordem das coisas assim como as coisas também pertencem à ordem do corpo. É também no plano do sensível que estará a possibilidade de percepção do outro. O outro habita um mesmo campo sensível, embora não habite a mesma consciência. Mas a experiência sensível é uma espécie de entendimento anterior à qualquer clivagem sujeito-objeto ou consciência-mundo.
Mundo e corpo são simultaneamente sujeito e objeto. (M.Ponty)




Maurice Merleau-Ponty escritor e filósofo líder do pensamento fenomenológico na França, nasceu em 14 de março de 1908, em Rochefort, e faleceu em 4 de maio de 1961, em Paris. Estudou na Ecóle Normale Supérieure em Paris, graduando-se em filosofia em 1931.
Em 1955 publicou"As Aventuras da Dialética".

domingo, 8 de agosto de 2010

A POESIA E O MITO DE CURA


Muitas vezes ficamos perplexos diante do que nos acontece na vida. Estamos sempre à pro-cura disto e daquilo e até, essencialmente, de nós mesmos. O que nos move na pro-cura é a Cura. Cura, do latim, assinala o Cuidado.
A Cura impulsiona todo nosso agir. Agir se diz em grego poiein, de onde nos vem poiesis, a essência do agir, a poesia. Poesia só é linguagem quando se torna verbo-ação-poiesis. Toda poesia nos advém a partir de Cura. É essa a fala do mito “Cura”.
A fala do mito é a linguagem do sagrado, por isso nele agem e falam deuses. O ser-humano (Entre-ser / Da-sein), a poesia e a linguagem pro-vêm da Cura.
É o que nos narra o mito Cura. Ele nos foi assinalado por Higino, escravo egípcio de César Augusto, que morreu no ano 10 da nossa era. Eis a sua saga:

C U R A
"Certa vez, atravessando um rio, Cuidado (Cura) viu um pedaço de terra argilosa: cogitando, tomou um pedaço e começou a fingir/ficcionar (fingere). Enquanto deliberava sobre o que criara, interveio Júpiter [Zeus]. Cuidado (Cura) pediu que lhe desse espírito, o que ele fez de bom grado. Quando, porém, Cuidado (Cura) quis dar-lhe nome a partir de si mesmo, Júpiter proibiu e dita que lhe deve ser dado o seu nome. Enquanto Cuidado (Cura) e Júpiter disputavam sobre o nome, surgiu também a Terra (Tellus), querendo dar o seu nome, uma vez que havia fornecido um pedaço de seu corpo. Os disputantes tomaram Saturno [Cronos/Tempo] como árbitro. Este tomou a seguinte decisão aparentemente eqüitativa:
"Tu, Júpiter, por teres dado o espírito, deves receber na morte o espírito, e tu, Terra, por teres dado o corpo, deves receber o corpo”. Como, porém, foi Cuidado (Cura) quem primeiro o fingiu/ficcionou (finxit), deverá pertencer-lhe enquanto ele viver. Como, no entanto, sobre o nome há controvérsia, chame-se Homem, pois foi feito de "humus" (Terra)".
Profº Manuel Antônio de Castro 
Ciência da Literatura, na Área de Poética,
Faculdade de Letras da UFRJ


quinta-feira, 5 de agosto de 2010

O que existe, os poetas fundam - Hölderlin

A poesia está nas ruas, assim como nas coisas. A poesia está em gestos involuntários. Entre frases obscuras. Na parede das cozinhas. Nos anéis da seiva, no tenteio dos filhotes, nas asas que latejam. Nos resíduos dos amantes, misturados com estrelas. A poesia está nos restos dos dias. Nos silêncios. Pouco percebida, a poesia verte sua secreta alquimia: transfigurar os sinais de menos, as marcas da miséria, o rumor do que poderia ter sido. Resgatar a dança de esperanças perdidas, o frescor das bocas, as mãos em luta amante com a matéria do mundo. Água vital das origens e das utopias, e sede infinita, a poesia está em tudo. No entanto, em paradoxo: a poesia é raríssima. Dificílima. Poucas, raras vezes a poesia emerge da natureza das palavras e transforma-se em poemas. Poucas, raras vezes os verbos e os nomes se fazem a carne absoluta da poesia, som e sentido em unidade mágica que recria o real, inventando-o. Milhares e milhares de versos, para algumas palavras de poesia. Muitas toneladas de matéria-prima-para alguns gramas de poema (Maiakovski).

Necessidade vital: por que tão escassa?

Por um lado, o mistério da emergência do poema, seu nascimento não redutível à consciência lógica nem à intencionalidade do sujeito que poeta. Por outro lado, há poucos instantes possíveis para o florescimento da poesia na história cotidiana.É preciso conviver com os poemas. Andar com eles. Sonhar com seus signos. Ler, reler, não sei quantas vezes. Renascer com suas palavras vivas. Expor-se à sua permanente revolução da linguagem. Deixar-se seduzir por seus cantos.


HÖLDERLIN-  foi ignorado por  Goethe e exaltado por Nietzsche. Segundo Heidegger, foi um "poeta da poesia", pois acreditava que "o que permanece, fundam-no os poetas".