sexta-feira, 5 de junho de 2009

O Apanhador de Desperdícios

Uso a palavra para compor meus silêncios.
Não gosto das palavras
Fatigadas de informar.
Dou mais respeito
às que vivem de barriga no chão
tipo água pedra sapo.
Entendo bem o sotaque das águas.
Dou respeito às coisas desimportantes
e aos seres desimportantes
Prezo insetos mais que aviões.
Prezo a velocidade
das tartarugas mais que a dos mísseis.
Tenho em mim esse atraso de nascença.
Eu fui aparelhado
para gostar de passarinhos.
Tenho abundância de ser feliz por isso.
Meu quintal é maior do que o mundo.
Sou um apanhador de desperdícios:
Amo os restos
como as boas moscas.
Queria que a minha voz tivesse um formato de canto.
Porque eu não sou da informática:
eu sou da invencionática.
Só uso a palavra para compor meus silêncios

Manoel de Barros-do livro “Memórias Inventadas”

4 comentários:

Alexandre Kovacs disse...

Lindo poema. Também o que mais se poderia esperar de um livro com este título maravilhoso: "Memórias Inventadas”

sueli aduan disse...

É esse livro é delicioso!!!eu gosto muito.

Natanael Gomes de Alencar disse...

Poema de barro e visgo de caracol...Lindo!

sueli aduan disse...

tb gosto muito!!!