LITERATURA EM FOCO
REVISTA LITERÁRIA ON-LINE
Por Letícia Nogueira
Carta 1.
Mãe, eu não queria ser tão direta, mas num vai ter jeito, o papel no Suriname é caro, muito caro. Mãe, o pai morreu. Foi assim: ele foi ao médico (mãe, no Suriname os médicos se vestem com terno preto e gravata vermelha ) reclamou de dor no peito. O médico deu uma risada, disse assim: “gases, gases”. Mandou ele para casa. Papai riu e disse: “imagina!, ir no médico por causa dum peidos de nada”. O resto a senhora já sabe. Manda um dinheiro, senão num dá para enterrar o pai.
Carta 2.
Mãe, como a senhora não mandou dinheiro, eu tive que enterrar o pai no quintal mesmo. A senhora imagina, mãe, que aqui no Suriname tem um imposto para ser enterrado? Eu perguntei o porquê da taxa; o médico — que mandou o papai peidar em casa — é, também, o prefeito da cidade; ele disse assim: “se vocês pagam imposto para cagar lá no Brasil, por que aqui não podem pagar para morrer no Suri Suri?”
Carta 3.
Mãe, ontem eu acordei o pai estava desenterrado, acho que a cova ficou rasa demais. Tinha dois cachorros comendo o cu do pai, mãe, literalmente. O que aconteceu com a senhora? Às vezes penso que a senhora não gostava muito do pai, e que deve estar rindo com a boca bem aberta, só porque eu disse que um pastor alemão comeu o cu dele. Mãe, manda dinheiro. Ah! O prefeito perguntou se a senhora gosta dum coroa charmoso.
Carta 4.
Mãe, o dinheiro não chegou. Eu falei para o médico/prefeito o que aconteceu. Ele disse que se fosse no Brasil o cu do pai já estaria no osso bem antes dele morrer. Mãe eu quero ir embora daqui. Manda o dinheiro.
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Por Letícia Nogueira
Carta 1.
Mãe, eu não queria ser tão direta, mas num vai ter jeito, o papel no Suriname é caro, muito caro. Mãe, o pai morreu. Foi assim: ele foi ao médico (mãe, no Suriname os médicos se vestem com terno preto e gravata vermelha ) reclamou de dor no peito. O médico deu uma risada, disse assim: “gases, gases”. Mandou ele para casa. Papai riu e disse: “imagina!, ir no médico por causa dum peidos de nada”. O resto a senhora já sabe. Manda um dinheiro, senão num dá para enterrar o pai.
Carta 2.
Mãe, como a senhora não mandou dinheiro, eu tive que enterrar o pai no quintal mesmo. A senhora imagina, mãe, que aqui no Suriname tem um imposto para ser enterrado? Eu perguntei o porquê da taxa; o médico — que mandou o papai peidar em casa — é, também, o prefeito da cidade; ele disse assim: “se vocês pagam imposto para cagar lá no Brasil, por que aqui não podem pagar para morrer no Suri Suri?”
Carta 3.
Mãe, ontem eu acordei o pai estava desenterrado, acho que a cova ficou rasa demais. Tinha dois cachorros comendo o cu do pai, mãe, literalmente. O que aconteceu com a senhora? Às vezes penso que a senhora não gostava muito do pai, e que deve estar rindo com a boca bem aberta, só porque eu disse que um pastor alemão comeu o cu dele. Mãe, manda dinheiro. Ah! O prefeito perguntou se a senhora gosta dum coroa charmoso.
Carta 4.
Mãe, o dinheiro não chegou. Eu falei para o médico/prefeito o que aconteceu. Ele disse que se fosse no Brasil o cu do pai já estaria no osso bem antes dele morrer. Mãe eu quero ir embora daqui. Manda o dinheiro.
No Comments to...“Cartas do Suriname - Cap. I”
Sueli Aduan Your comment is awaiting moderation. wrote on July 31st, 2009
Impressionante como apesar do uso de “algumas palavras”, digamos chulas, a autora consegue estabelecer uma beleza, uma poética.Gostei muito. A tristeza da imagem tem como contraponto um humor “sutil” na maneira como descreve os fatos Critico. Reflexivo.
Parabéns
Sueli Aduan Your comment is awaiting moderation. wrote on July 31st, 2009
Impressionante como apesar do uso de “algumas palavras”, digamos chulas, a autora consegue estabelecer uma beleza, uma poética.Gostei muito. A tristeza da imagem tem como contraponto um humor “sutil” na maneira como descreve os fatos Critico. Reflexivo.
Parabéns
6 comentários:
Interessante !!!
Sueli,
EStá bem escrito, e é de uma ironia impressionante.
é mesmo Marinês!!!! (rs)
é pelo jeito a ironia é muito forte nos trabalhos dela. Eu gosto muito!!!
Sueli,
Que lurgar "mais bom" de ficar, esse seu.
Adorei o texto. Sempre se pode tirar uma graça da desgraça.
Ah! já ia esqueçendo...esse vídeo da Adriana com a cantora de fados é fantástico.
Boa semana e obrigada pela visita.
Beijão
OiIra Buscacio,obrigada, tb curto muito 'passear" pelo seu blog.
O texto é muito bom mesmo ( veja outroS dela na 'Literatura em foco'
abs
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