A poesia está nas ruas, assim
como nas coisas. A poesia está em gestos involuntários. Entre frases obscuras.
Na parede das cozinhas. Nos anéis da seiva, no tenteio dos filhotes, nas asas
que latejam. Nos resíduos dos amantes, misturados com estrelas. A poesia está
nos restos dos dias. Nos silêncios. Pouco percebida, a poesia verte sua secreta
alquimia: transfigurar os sinais de menos, as marcas da miséria, o rumor do que
poderia ter sido. Resgatar a dança de esperanças perdidas, o frescor das bocas,
as mãos em luta amante com a matéria do mundo. Água vital das origens e das
utopias, e sede infinita, a poesia está em tudo. No entanto, em paradoxo: a
poesia é raríssima. Dificílima. Poucas, raras vezes a poesia emerge da natureza
das palavras e transforma-se em poemas. Poucas, raras vezes os verbos e os
nomes se fazem a carne absoluta da poesia, som e sentido em unidade mágica que
recria o real, inventando-o. Milhares e milhares de versos, para algumas
palavras de poesia. Muitas toneladas de matéria-prima-para alguns gramas de
poema (Maiakovski).
Necessidade vital:
por que tão escassa?
Por um lado, o mistério da
emergência do poema, seu nascimento não redutível à consciência lógica nem à
intencionalidade do sujeito que poeta.Por outro lado, há poucos instantes
possíveis para o florescimento da poesia na história cotidiana.É preciso
conviver com os poemas. Andar com eles. Sonhar com seus signos. Ler, reler, não
sei quantas vezes. Renascer com suas palavras vivas. Expor-se à sua permanente
revolução da linguagem. Deixar-se seduzir por seus cantos.
HÖLDERLIN- foi ignorado por Goethe e exaltado por Nietzsche. Segundo
Heidegger, foi um "poeta da poesia", pois acreditava que "o que
permanece, fundam-no os poetas".
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