sexta-feira, 13 de fevereiro de 2009


Radmila Zygouris, num belo texto acerca do estrangeiro nos alerta que o genocídio não ocorre entre os animais; ele é específico dos humanos, pois só é cometido quando apoiado num discurso.
Oxalá o nosso deixe de banalizar a violência!

Akira Kurosawa assim nos contou um de seus sonhos
O Túnel
O homem caminha e está para entrar num túnel quando de dentro dele surge um cachorro que o ameaça. Amedrontado, percorre o túnel e, ao sair, é surpreendido pela presença de um recruta. "Comandante, fui realmente morto em combate?" "Não acredito que tenha sido morto. Fui para casa. Comi os bolinhos de arroz de minha mãe." O comandante, surpreso e assustado, explica-lhe que ele fora ferido, tivera um sonho – com a casa dos pais, mas depois morrera em seus braços. O recruta aponta para a casa dos pais dizendo que eles o esperam. "Eu acredito mas, meus pais não acreditam que morri. Continuam esperando por mim." O Comandante se compadece mas sabe que só sob suas ordens ele pode se retirar. Ordena-lhe, então, que volte para o lugar de onde viera.
Vai seguir seu caminho quando surgem novos passos atrás dele. É todo o terceiro batalhão que se apresenta. "Terceiro batalhão retornando sem baixas". Todos vocês foram mortos em combate. Mandei-os para a morte. Eu poderia responsabilizar a estupidez da guerra. Mas não posso desculpar a minha negligência e incompetência... Sinto sua amargura e sofrimento. São chamados de heróis, mas morreram como cães.
Na guerra, no combate, não há lugar para sofrimento... Os fantasmas só desaparecem quando o comandante se re-apropria de sua função: "Terceiro Pelotão! Meia volta volver!". Mas o cão raivoso (que era como ele havia descrito a morte de seu pelotão) continua a atormentá-lo.
Questão crucial apontada por Kurosawa: como pode um soldado, um comandante, sobreviver à morte de seus parceiros já que os fantasmas dos que morreram dificilmente o deixarão sossegar? Como pode um filho morrer se seus pais ainda estão vivos e o esperam? A morte das crianças e dos jovens traz, além da dor que lhe é inerente, algo mais, também inaceitável: os filhos não morrem antes dos pais! É toda a possibilidade de esperança e de futuro que fica ameaçada.
Como sobrevivemos nós a um cotidiano tão ameaçador para a vida? Que custo isso nos traz? Estes que morrem nas ruas, nas chacinas, nos assaltos, não são nossos parceiros de guerra?

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