quinta-feira, 21 de maio de 2009

Farol de Milha- (em três capítulos)

Capítulo I
Desligou o motor. Tirou as chaves guardou-as no bolso. Encostou lentamente a cabeça no banco, escorregou um pouco o corpo, os pés quase tocaram o acelerador. Esse incidente alegrou seu coração. Ligar novamente o motor, um pisão forte e bum... ribanceira abaixo. Quando encontrassem o carro, se o encontrassem, pensariam que foi um acidente. Mas era isso que queria? Tinha dúvidas, estrada perigosa em noites frias como esta quase impossível dirigir. Bom ter encostado um pouco, pôr as idéias em ordem. Seguir o conselho da mãe, na despedida, insistiu muito:-
Adallberto, por favor. Por favor, hein! Faça outro caminho. Quem sabe a BR 116, ou então use os faróis, aqueles, os de milha.
Mãe, eu já lhe expliquei. Farol de milha... - ela erguia um pouco o olhar, os olhares encontravam-se e ele se fechava, não falava mais.
Porque será que esse olhar exercia tanto poder sobre ele, quando criança ficava horas olhando para esses mesmos olhos, e na sua inocência de menino pensava que eram um pedacinho do mar.
Os olhos da minha mãe são azuis da cor do mar. O mar é verde, retrucava Conceição. Ele bravo gritava, na rua, na escola pros amigos:
Azul, azul, azul e azul. Ria muito.
A mãe, era uma mulher magra, pele morena, um olhar sonso e agudo. Dava-lhe surras quando o ouvia falando assim com os meninos.
Dizia que não se pode humilhar os outros. Como se fosse obrigação ter olhos claros.
Pobre moleque. Às vezes escondia-se no fundo do quintal embaixo da velha paineira. Lá, no silêncio da noite, fazia planos. Era sempre o herói alegre, sorridente, mesmo quando em suas mãos, presenciava a morte de algum dos bichos. O sangue escorrendo não o incomodava, sentia uma coisa esquisita que não sabia explicar. Mãe sim, ficava com os olhos cheios d’água. Momento mais inoportuno para recordações.
Olhou o relógio 4 horas. Logo a polícia localizaria o carro. Alguém já deveria ter encontrado o corpo. Pensamento besta. Uma noite fria dessas, impossível. Sossegou. Ligou o rádio na procura de alguma notícia, nada. Só música.
Balançou o corpo ao som do bolero, sorrindo cantarolou: “Dois pra lá, dois pra cá, a cuba libre dá coragem, a dama de lilás”... . Há quanto tempo não dançava não se divertia. Vidinha pobre.
“Dois pra lá, dois pra, cá.”, parou de repente, um estalo bombardeou sua mente Como não pensei antes, Ceição, por que não procura-lá? Certamente ela ajudaria. Era uma mulher generosa, sempre envolvida em favor das minorias, dos excluídos, como costumava dizer nos comícios acreditava na mudança, na bondade do ser humano e nessas baboseiras todas. Sempre achei isso tudo um porre.
Decidido ligou o carro, e arrancou a toda, praia de Copacabana, lembrava exatamente do prédio. Não poderia ter sido outro o local escolhido. Tudo tão à mão, o morro, saídas estratégicas, a avenida principal e acima de tudo o povo, uma gente dada à alegria, à descontração. Ideal para misturar-se, ficar uns tempos escondido até a poeira baixar. Trêmulo, sem saber exatamente o que falar, tocou a campainha, depois de um longo abraço e um breve fitar de olhos foi Conceição quem falou.
Um novo plano, dessa vez sem erros. Adalberto não pestanejou, nem poderia, instalou-se confortavelmente no velho sofá e a noite, após o jantar, dirigiu-se a uma saletinha existente no fim do corredor. Ao lado uma janelinha com cortinas brancas, um vaso verde com flores, uma mesa de madeira tentavam dar ao ambiente um clima de lar. Apartamento pequeno, simples.
È, a gente se acostuma com a pobreza, a morar em apartamentos de fundos, ficar sem ver a rua, comer pouco. Eram os pensamentos de Adalberto quando Conceição, vindo da cozinha, sorrindo, entregou-lhe um amontoado de papéis. Meio sem jeito como se ela tivesse percebido seus devaneios, esticou as mãos e começou rapidamente a leitura.
Peça chave do esquema, ela deveria afastar-se uns dias do apartamento para reaparecer no momento exato. Maneco e Luís ficariam no carro atentos ao movimento da avenida. Detalhes, nomes de pessoas, horários, gráficos, tudo devidamente organizado.
Acabada a leitura, Adalberto fitou Conceição por algum tempo, em silêncio e fechando a cara disse:

4 comentários:

jugioli disse...

...espero os próximos capítulos!!!
Adorei vir conhecer o seu lindo espaço.

Obrigado por acompanhar o @dis-cursos,

bjs.

sueli aduan disse...

jugioli:
que bom que gostou,logo, logo, vai poder ler os outros capítulos.
Gostei demais do teu blog.
bjs

Adriana Riess Karnal disse...

Sueli: O que ele dissse, o que ele disse???

sueli aduan disse...

Adriana:
hã,hã..logo,logo vc vai ficar sabendo (rsrs)
beijão